segunda-feira, 29 de agosto de 2011
A Bagagem Inesperada
Sexta-feira, 27 de novembro de 2009!
Ah, dia feliz! Último dia de trabalho e, enfim, férias!
Era uma manhã linda, ensolarada e que prometia ser um dia de calor em Curitiba.
No trabalho havia muitas coisas a fazer, muitos detalhes a acertar antes de entrar em férias. Eu trabalhava freneticamente tentando me lembrar de todos os detalhes necessários a fim de não deixar pendências.
A certa altura, falei aos colegas:
- Gente, estou indo ao médico buscar o resultado de um exame e volto logo. Um pé pra ir e outro pra voltar.
Tomei o ônibus e encontrei a sala de espera repleta. Com um livro nas mãos eu relaxo completamente, mas naquele dia eu não tinha nenhum comigo. Fiquei folheando revistas e pensando no que eu poderia estar fazendo no trabalho durante aquele tempo de espera. O retorno ao trabalho demoraria mais do que o esperado.
Quando cumprimentei o médico e entrei no consultório tinha em mente todas as perguntas que eu gostaria de fazer a ele. Havia me decidido a remover meu cisto complexo, mas não queria sacrificar minhas férias e nem complicar a vida dos colegas de trabalho. Março do próximo ano seria uma época boa.
Ele deu uma olhada no resultado de minha biópsia e me estendeu o laudo sem pronunciar uma única palavra.
Procurei localizar a informação mais importante na página e li:
"Carcinoma ductal invasivo grau 3"
Carcinoma, carcinoma, carcinoma... aquelas palavras me diziam que sim, eu estava com câncer. Isso eu não precisava perguntar. E nem conseguiria.
Imediatamente minha garganta trancou; tive a sensação de ter uma bola de tênis entalada nela. O ar não entrava, o ar não saía.
De alguma forma bizarra, eu precisava aliviar a pressão interior que me explodiria a qualquer momento, e as lágrimas teimavam em não sair, logo agora que eu precisava delas.
Curiosamente, não senti o teto desabar sobre minha cabeça e nem o chão fugir de sob meus pés. Me lembrei da ansiedade vivida durante toda a semana, das anotações feitas e concluí: "Minha intuição sabia que eu estava doente. Minha mente, não."
Após a maternidade eu estava lendo o livro "Mulheres Que Correm Com Os Lobos", de Clarissa Pinkola Estés, e me encontrava imbuida da tarefa de estimular minha intuição há anos soterrada por meu raciocínio lógico.
Ponto pra intuição!
Quando consegui restabelecer minha respiração e fazer algumas lágrimas correrem pelo rosto, fiz ao médico um sinal de quem pede tempo nos esportes, procurei lenços em minha bolsa, sequei as lágrimas e disse:
- Não foi isso que eu vim fazer aqui. Queria apenas discutir os procedimentos para a retirada de um tumor benigno...
- É, veja bem, eu também não imaginava esse resultado.
Enquanto o médico pronunciava suas sentenças de pesar, me lembrei de uma característica particularmente estranha de minha família: havia pouco espaço para o acolhimento dos sentimentos e das emoções, e uma intensa cobrança de reações práticas.
Minha mãe ouvia atentamente minhas lamentações infantis e juvenis, cumpria suas funções de matriarca me aconselhando com as melhores palavras encontradas em seu rol de experiências de vida e rematava:
- É, minha filha, mas a vida continua. O mundo não pára de girar e a gente não pode parar também.
Era uma maneira dura de dizer que não importava qual fosse o sabor da fruta, laranja ou limão, eu sempre deveria tirar o melhor delas, fosse a laranjada ou a limonada.
Essa força bastante treinada durante 36 anos assumiu o controle sobre aquela parte de mim que se sentia pequena, triste, desamparada, desesperada e que pedia por socorro. Então, essa força me fez dizer:
- E agora Doutor, o que eu faço?
Ele me conduziu a uma sala de exames, me pediu pra tirar a blusa e o sutiã, palpou o nódulo, simulou desenhos em minha mama direita pra visualizar o tamanho da mutilação que eu sofreria, analisou a anatomia de minhas duas mamas e me propôs uma cirurgia conservadora. Traduzindo: uma cirurgia que eliminaria o pedaço doente de minha mama + as áreas de segurança (pra evitar que o câncer se alastrasse no pedaço restante).
Perguntei se ele operava com o auxílio de um cirurgião plástico e a resposta:
- Não, eu não preciso. Sou especialista em reconstrução mamária.
- E como você faria essa reconstrução?
- Poderia usar um retalho de gordura abdominal.
- E como ficaria? Você tem fotos pra me mostrar?
Ele apanhou um livro com fotos artísticas de mulheres que tiveram câncer e sofreram os mais diversos tipos de mutilações, não somente as mamárias. Vendo aquele festival de cicatrizes com três ou quatros dedos de largura, me lembrei da cirurgia que uma grande amiga havia feito meses antes de meu diagnóstico: ela teve câncer na mama direita, como eu, esvaziou a mama e o cirurgião plástico a reconstruiu com um músculo abdominal + gordura abdominal; ela ficou com um seio lindo (diferente do original, mas muito bonito) e ganhou uma abdominoplastia de brinde.
Olhei bem pra cara do Doutor, olhei para as fotos das mutilações e perguntei:
- Você acha esse tipo de reconstrução satisfatória?
- Sim, do ponto de vista mastológico e de reconstrucão estão ótimas!
- Pra mim são horríveis! Não são reconstruções! São mutilações!
- Ah, mas não tem outro jeito de fazer! Você acha que um cirurgião plástico vai deixar você sem cicatrizes?
- Sem cicatrizes, não, mas pelo menos elas ficam fininhas e quase desaparecem com o tempo!
- Não, mas veja bem...
Enquanto eu ouvia todas as justificativas injustificáveis com as quais ele tentava me convencer que aos meus 36 anos eu não deveria buscar uma reconstrução mamária plástica, afinal, plástica é estética, e eu estava doente, deveria cuidar de minha saúde, e não da beleza... blá blá blá
Juro que fiquei com umas perguntas na ponta da língua! Só não as pronunciei por prudência. Imaginem se eu falo e ainda, por um azar maior do que aquele de ter câncer, caio nas mãos dele pra uma cirurgia?
Mas eu queria perguntar:
- Doutor, por acaso o senhor fez sua especialização em reconstrução com o Dr. Frankenstein? O senhor é discípulo dele? Meio disfarçado pra ninguém perceber?
Ora, já não bastava ter câncer aos 36 anos? Poderia ficar pior ainda?
Saí do consultório com mais uma lista de exames pra fazer, e uma relação de médicos a consultar, principalmente um oncologista. Todo o meu tratamento dependeria do resultado de meus exames e do que o oncologista me dissesse.
Quando entrei no consultório do mastologista eu trazia comigo certos pensamentos: tarefas a concluir no trabalho, que bagagem levar na viagem de férias... com certeza haveria biquíni, protetor solar, shorts, camiseta, máquina fotográfica...
Cerca de uma hora depois, sem que eu fosse consultada, sem que tivesse a chance de qualquer escolha, me senti obrigada a esvaziar minhas malas pra colocar nelas outro tipo de bagagem que me acompanharia, não somente nos próximos trinta dias de férias, mas nos próximos meses, e que incluia exames, cirurgia, mutilação, quimioterapia, radioterapia, perda da mama, perda dos cabelos... muitas perdas...
MEU DEUS, NÃO QUERO FAZER ESSA TROCA!
quarta-feira, 10 de agosto de 2011
As Férias?
"Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente." Carlos Drummond de Andrade
Férias, ah, as férias estão chegando! No final do ano de 2009 eu também estava me preparando para passar uma semana na praia com minha família em Santa Catarina e depois festejar o Natal com os familiares no norte do Paraná.
Meus preparativos envolvem exames periódicos, pois com um histórico familiar mórbido como meu, preciso fazer prevenção.
Por falar em prevenção, desde os 22 anos de idade realizo exames de rotina a cada 6 meses. Mesmo quando meu médico me garantia que eu era jovem e podia fazer check-up anualmente, eu comparecia ao consultório semestralmente e o obrigava a me solicitar exames.
Em 2009 não realizei os tais exames no primeiro semestre. Com toda a mudança na rotina gerada por minha maternidade repentina, não os fiz. E não foi por esquecimento, porque me lembrei deles. Foi por opção, afinal eu estava muito cansada e, certamente, estaria bem, como em todas as outras vezes, afinal, eu estava mais feliz do que nunca.
Numa manhã de novembro, dia lindo de sol e calor em Curitiba, fui realizar exames de imagem comuns: mamografia e ultrassonografia de mamas (em Curitiba o pessoal diz ecografia de mamas).
O ultrassonografista me diz:
- Você tem um cisto na mama direita.
- Posso ficar com ele?
- Posso ficar com ele?
- Vamos ver... bem, como se trata de um cisto complexo preciso recomendar a realização de uma biópsia.
Esse cisto, diferente dos demais que eu havia tido, era uma bolsa cheia de líquido com um pequeno nódulo sólido dentro, como se alguém tivesse enchido uma bexiga de água e inserido uma bolinha de gude dentro dela.
Nessa manhã eu saí do laboratório me sentindo fora do rumo.
Cisto complexo? Meu Deus, o que era isso? E logo agora que eu havia assumido a responsabilidade por um filho? O que fazer? O que pensar? O que? Por que? Para que? Como?
Minha cabeça tornou-se uma máquina de pensamentos geradora de interrogações em ritmo acelerado. Uma infinidade delas.
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Eu olhava para a paisagem ao meu redor e, embora tivesse certeza absoluta de que tudo era colorido, algo dentro de mim impedia que as cores me tocassem. Tetricamente, tudo parecia ter sido pintado em tons de cinza e branco e preto.
Fui encontrar meu marido, que também estava no médico, antes de ir ao trabalho. Falei com ele sobre o "achado". Me sentia oprimida por tanta tristeza. Precisava que ele me tirasse do poço em que eu havia despencado.
Fui encontrar meu marido, que também estava no médico, antes de ir ao trabalho. Falei com ele sobre o "achado". Me sentia oprimida por tanta tristeza. Precisava que ele me tirasse do poço em que eu havia despencado.
- Não deve ser nada - ele respondeu.
Tentei argumentar, embora não tivesse argumentos além dos imaginários, para que ele percebesse o desespero em que eu me encontrava.
- Bom, a gente tem que esperar o resultado do exame - falou a voz da lógica masculina.
Minha ansiedade + tristeza + preocupação estavam me sufocando.
Minha ansiedade + tristeza + preocupação estavam me sufocando.
Passei o dia todo no trabalho sem conseguir me concentrar em nada, e nem comer, e olhe pra que perder meu apetite eu tenho que estar muito, MUITO mal.
Três dias se passaram assim, indistintos, em que eu esperava somente o desdobrar das horas mergulhada num mar de ansiedade, com uma bola de tênis entalada na garganta, sem dormir à noite, repetindo a Deus a oração que tantas vezes ouvi minha mãe recitar:
- Meu Deus, me permita viver pra criar meu filho! Eu não posso abandoná-lo agora. Ele já foi abandonado uma vez. Eu simplesmente não posso fazer isso com ele. Você, meu Deus, permitiu que ele viesse pra minha vida nesse momento; me ajude! Me ajude! Preciso viver pro meu filho! Câncer agora não!
Em casa, com meu Marido, o assunto quase não era comentado. Cada um sentia a tensão no ar, a preocupação, a aflição do outro, mas sem recursos pra ajudar, não se falava no assunto, como se não pronunciar certas palavras tivesse o poder de tirar delas a força, até que, enfraquecidas, não conseguissem se tornar realidade.
No terceiro dia após o exame, fui buscar os resultados já com duas consultas agendadas para aquele dia - meu ginecologista e um mastologista que não era o meu oficial. No meu mesmo, eu iria só no dia seguinte, mas não estava com vontade de perder mais uma noite de sono, resolvi me consultar com outro.
Entre uma consulta fui comprar uma fruta. Estava morta de fome.
Encontrei uma moça de cabelos bem curtinhos que me parecia conhecida. E era. Tratava-se de minha ex-vizinha que eu não via há mais de um ano.
- Caramba, como você está diferente! Cortou os cabelos!
- É, eu tive câncer de mama no início do ano. Perdi os cabelos após a primeira quimio.
Meu Deus! Senti um calafrio percorrer meu corpo... seria um sinal? um sinal de que algo parecido estava pra acontecer comigo?
Credo! Bata na madeira, Fabiana! Xô! E não viaje na maionese! Foi só uma coincidência.
Quando falei com o mastologista, ele me tranquilizou muito. A probabilidade de um câncer se manifestar na forma intra-cística era muito pequena. Ele mesmo nunca havia pego nenhum caso. Câncer normalmente é diferente. Mesmo assim, a fim de proporcionar um diagnóstico mais apurado, ele me sugeriu fazer uma ressonância magnética das mamas.
Ufa, voltei pra casa com o coração leve como uma pluma levada pelo vento.
Graças a Deus meus dias de agonia haviam terminado e eu não perderia outra noite de sono.
Meu mastologista realmente me pediu uma biópsia, mas também me tranquilizou: em mais de 20 anos de profissão ele havia diagnosticado apenas um caso de câncer de mama intra-cístico numa senhora de mais de 60 anos de idade. Saí do consultório dele decidida a não ser seu segundo caso.
A biópsia é um exame cujo resultado é meio demorado, em torno de 30 dias.
Com a paz de espírito de volta a minha alma, passei bem quase todo esse período.
Apenas nos últimos 5 dias que antecederam o resultado da biópsia é que senti uma ansiedade despropositada, uma bola de tênis trancando minha garganta, uma dificuldade enorme de concentração que eu não sabia de onde vinha.
Vasculhando meu interior eu não encontrava medo; estava convicta de que não teria câncer, apenas um cisto benigno que teria que ser removido. Algo me dizia que poderia ser minha intuição, mas como nunca fui uma mulher intuitiva, anotei essas sensações num caderno pra depois confrontá-las com o resultado do exame.
Sou muito lógica e meu raciocínio me levou a pensar que, apenas 10% dos casos de câncer são genéticos; cistos intracísticos são raros; câncer não é doença de pessoas felizes, e isso, com toda a certeza, eu era; eu não estaria incluída numa estatística tão restrita como essa.
E assim cheguei ao meu último dia de trabalho, véspera de minhas tão esperadas férias em "famila", como dizia meu filhote de apenas 2 aninhos de idade.
Sou muito lógica e meu raciocínio me levou a pensar que, apenas 10% dos casos de câncer são genéticos; cistos intracísticos são raros; câncer não é doença de pessoas felizes, e isso, com toda a certeza, eu era; eu não estaria incluída numa estatística tão restrita como essa.
E assim cheguei ao meu último dia de trabalho, véspera de minhas tão esperadas férias em "famila", como dizia meu filhote de apenas 2 aninhos de idade.
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Local:
Curitiba - PR, Brasil
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
O Grande Enigma da Maternidade
Antes de receber a visita definitiva de uma cegonha, eu sempre perguntava a minha psicóloga:
- Me diga: como é que uma mulher gesta um filho durante nove meses, passa mal, sente dores no parto, às vezes dificuldades para amamentar, acorda à noite para cuidar do filho pequeno, dorme pouco, trabalha muito, vive cansada e ainda tem coragem de dizer que ser mãe é bom? Isso não entra na minha cabeça!
O ano de 2009 foi bastante atípico e emocionante para minha família.
Meu marido e eu estávamos aguardando uma cegonha chegar a qualquer momento. Em meus planos, 2009 seria o ano da preparação da casa. Encomendamos os móveis da cozinha em Janeiro, e a cegonha conseguiu chegar antes deles.
Quando o trouxemos nosso Filho pra casa descobrimos que não tínhamos sequer sabonete infantil em casa, o que se dirá de banheira? Também não tínhamos um berço! Aliás, o quarto do Alexandre estava repleto de caixas com nossos utensílios de cozinha. Mesmo assim, colocamos um colchão no chão e o pusemos pra dormir lá.
O primeiro final de semana foi sensacional: tivemos visitas, um chá de bebê providencial (porque tínhamos o essencial, mas nos faltava quase todo o resto), o Papai participou de sua primeira corrida de rua, agora na qualidade de Pai, cruzando a linha de chegada com o Filho nos braços!
Quando chegou a primeira segunda-feira do resto de nossas vidas é que percebi como me sentia segura ao lado do meu Marido, e como o inverso era verdadeiro.
Eu tentava fazer coisas que nunca tinha feito antes em toda a minha vida: dar atenção ao meu Filho, seguir uma rotina com ele, e ao mesmo tempo dar conta de fazer a comida, lavar as roupas e as louças (que resolveram procriar como coelhos), manter tudo em ordem... resumindo, eu tentava driblar, cabecear, marcar o gol e jogar na defesa, tudo ao mesmo tempo. Me sentia um fracasso completo!
O Alexandre havia desenvolvido muitas habilidades motoras, mas falava poucas palavras. Quando ele me dizia coisas que eu não entendia - e acreditem, isso acontecia em quase 90% do tempo - eu dizia:
- Filho, eu sou a sua mãe. Supostamente eu deveria entender tudo o que você me diz. Mas eu não entendo nada! Ele ficava bravo comigo, desafiava minha autoridade e encenava birras dignas de uma produção cinematográfica. Quando eu ficava brava ele tentava me seduzir com um sorriso muito engraçado (que era de derreter o coração, tenho que admitir) pra converter a bronca num carinho. Percebi que, com apenas um ano e oito meses, meu Filho já conhecia a arte da sedução e tentava me manipular. Eu tinha que ser firme e não rir, e como era difícil!
Não era só eu que estranhava a nova rotina. O Alexandre também! Ele acordava a cada meia hora ou quarenta minutos todas as noites. Durante o dia eu não podia sair da vista dele que o garoto gritava feito um louco.
Passei a acordar às seis horas da manhã pra tomar um banho com calma, ter um café da manhã sossegada no meio da bagunça geral, só que, de alguma forma qeu não compreendo, parece que havia alguma conexão entre nós - quanto mais cedo eu acordava, mais cedo ele acordava também.
No sexto dia de maternidade ele acordou tão cedo que eu mal tive tempo de me vestir depois do banho. Tomar café, nem pensar! Eu costumava almoçar quando ele dormia após o almoço. Nesse dia ele não dormiu à tarde (e eu não almocei). Eu não podia imaginar como uma criança pode ficar tão agitada quando está com sono! Meu Deus, eu sentia fome, e sede, e vontade de ir ao banheiro e o menino não me deixava um segundo sequer!
Quando meu Marido chegou em casa à noite, o Alexandre estava agitadíssimo, a casa estava de pernas pro ar, eu estava com mais sede, fome e sono do que nunca, e à beira de um ataque de nervos!!!!!!! Quando percebeu que eu estava com um humor de morte, ele pegou nosso Filho nos braços e o levou pra um passeio. Quando chegou em casa eu estava lavando roupas, chorando e me questionando:
- O que foi que eu fiz da minha vida? Estava tudo tão tranquilo! Agora eu nunca mais vou conseguir dormir uma noite inteira! Nunca mais vou poder tomar um banho devagar, ou fazer uma refeição com calma, sem interrupção! Ou mesmo ir ao banheiro! O que foi que eu fiz com a minha vida, meu Deus???????
Depois que o Alexandre dormiu, meu Marido me deu uns conselhos óbvios:
- Você tem que ensinar ao nosso Filho que você tem necessidades e ele tem que respeitá-las.
Eu, que era super independente em tudo, agora precisava me explicar, me justificar, contar cada um dos meus passos a um mini-homem, de apenas 85 cm de altura! Era só o que me faltava!
Entre tentativas, erros e acertos, muitas birras, choros, mordidas, cadeiras do pensamento, cócegas, risos, brincadeiras, teimosias, virose, madrugada no pronto-socorro, adaptação à escola, vacinas, retorno ao trabalho, a família toda se adaptou à nova rotina e tudo voltou para os eixos novamente, considerando-se que os eixos era muito diferentes agora.
Tenho que confessar que quando aquele pequeno projeto de homem me chamou de Mamãe pela primeira vez me olhando nos olhos, ele me fisgou pra todo o sempre! Fiquei completamente apaixonada por aquele menininho lindo de olhos verdes! Mal podia crer que eu era a mãe dele! Eu me sentia a mulher mais feliz e realizada do mundo!
Fui com minha família visitar minha psicóloga, dessa vez como amiga. Depois da chegada do meu Filho não tive mais tempo para fazer terapia.
Observando a dinâmica de minha família, dessa vez foi ela quem me perguntou:
- Você conseguiu resolver seu grande enigma de maternidade? Por que as mulheres ainda gostam de ser mães, com toda a trabalheira que dá?
- Sim, consegui.
- Entrou em sua cabeça?
- Não. Descobri que não entra na cabeça; entra no coração!
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Local:
Curitiba - PR, Brasil
segunda-feira, 1 de agosto de 2011
A Chegada da Cegonha
Na tarde de 27 de Janeiro de 2009 eu estava trabalhando quando recebi uma ligação do meu marido:
- Esposa, o que você vai fazer amanhã à uma e meia da tarde?Respirei fundo e pensei em dizer algo como:
- Olhe, meu bem, amanhã, nesse horário, eu pretendo estar mergulhando no mar do Caribe, ou saboreando um delicioso peixe grelhado com muitas alcaparras num belo barco em Aruba, acompanhado de uma cervejinha bem gelada. E você?
Ao contrário, respondi:
- Bom, nesse horário devo estar trabalhando.
- Você quer ir conhecer seu filho?
- Como assim, conhecer meu filho?
- É que a S. do Juizado da Infância e Juventude me ligou e perguntou se poderemos ir até lá pra conhecer nosso filho. Ela disse que é um menino lindo, que tem os seus olhos, e se chama Alexandre Henrique.
- Ara, Marido, que assunto mais besta pra se fazer brincadeira!
- Não é brincadeira, não. Estou falando sério. Você quer ir conhecer o nosso filho amanhã?
- Claro que quero! Você não está brincando?
- Não, eu vou ligar pra ela e confirmar nosso horário.
- Ah, tá, tudo bem então!
Desliguei o telefone e fui à sala ao lado avisar minha chefe e colegas de trabalho:
- Amanhã após o almoço eu não poderei vir trabalhar. Vou conhecer meu filho!
Foi aquela gritaria, choradeira, emoção, abraços pra todo lado e uma avalanche de perguntas, entre elas:
- O que você vai fazer agora? Vai arrumar uma babá, uma empregada, ou vai deixar seu filho na escolinha o dia todo?
Quem me conhece já sabe que a essa altura minhas mãos e meus pés estavam inundados de suor. Parei de respirar, entrei em pânico, fiquei completamente apavorada. Só conseguia pensar:
- E agora, Meu Deus, o que vou fazer?
Liguei pra madrinha de meu filho, escolhida tempos atrás, e confessei:
- Estou com medo, apavorada, não sei o que fazer.
E não consegui nem chorar de emoção. Sentia uma bola de tênis entalada na garganta, os olhos esbugalhados (a bola de tênis era a culpada), a respiração curtinha, e um pânico enorme.
Naquele dia meu Marido e eu não conseguimos trabalhar direito, nem comer, nem dormir e passamos a noite falando sobre como a gente achava que o Alexandre Henrique seria.
No horário marcado estávamos no fórum pra nos submeter ao processo e quando caminhávamos para nosso carro, indo finalmente conhecer nosso filho, em carne e osso, Marido me disse:
- Minhas pernas estão tão bambas que acho que não vou conseguir dirigir até lá.
Nas fotos o Alexandre era bonito, mas ao vivo...
Quando o avistamos, Marido segurou forte na minha mão:
- Esposa, ele é lindo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
A gravidez do coração é assim, ninguém sabe como e nem quando começa mas a gente sabe que acontece assim:
Uma estrelinha distraída entrega seu filho no endereço errado; Um anjinho descobre onde ele está e conta pra uma cegonha;
A cegonha chega num lindo dia qualquer trazendo O SEU FILHO, que você esperava que chegasse, mas não sabia quando chegaria.
E quando ele chega, sua vida dá cambalhotas e piruetas e nunca, NUNCA mais será a mesma, para todo o sempre!
Amém.
A Nuvem Negra da Família Adams
A nuvem negra da Família Adams |
Um pouco antes de morrer ela me convocou e me disse que eu deveria consultar um ginecologista pra fazer exames preventivos. Detalhe: eu nunca havia ido a um gineco.
Durante os anos que se seguiram fui ao ginecologista a cada seis meses realizar os exames que toda mulher faz.
E eu sentia que carregava uma nuvem negra, como aquela que paira sobre a casa da Família Adams, sobre minha cabeça.
Ao final de cada bateria de exames eu respirava aliviada e dizia a mim mesma:
- Ufa, ainda não foi desta vez!
De alguma forma, sem embasamento científico algum, eu achava que um dia eu teria câncer. Era só uma questão de tempo até isso acontecer. E conviver com uma nuvem negra pairando sobre minha cabeça, acompanhando meus passos era opressor, depressor, triste... Era sentir, todos os dias, medo de algo que eu acreditava ser inevitável, e viver esperando que meus temores se concretizassem... algum dia...
Minhas famílias materna e paterna tiveram vários tipos de câncer, todos diferentes um do outro. Às vésperas de meu casamento, meu pai foi diagnosticado com um tipo de leucemia.
Aí eu pirei completamente!
Passei a discutir com meu médico porque acreditava que os exames que ele me pedia eram insuficientes para cobrir uma investigação de câncer em meu corpo todo. E com meu histórico familiar eu tinha que ficar bem esperta! Filha de pai e mãe que tiveram câncer, era só uma questão de tempo pra acontecer comigo também!
Ora, eu fazia exames de colo de útero e mama. Mas e se eu tivesse leucemia? Ou um tumor maligno no estômago ou intestino? E se fosse no pulmão? Ou nos ossos? E se...? E se...? Como é que iríamos descobrir a doença no início com tão poucos exames?
O médico me encaminhou para um oncologista.
Nessa época eu morava em Londrina/PR
Me lembro que quando cheguei à clínica e me deparei com crianças, jovens, adultos e idosos sem cabelos e com aparência de pessoas em tratamento me senti muito feliz por não ser uma delas! Pelo menos por enquanto...
O oncologista ouviu minha história, minhas neuras e me falou sobre os vários tipos de câncer, da inviabilidade de se realizar exames frequentes que cobrissem todas as possibilidades da doença.
A hereditariedade se caracteriza por vários casos de um mesmo tipo de câncer na família, como por exemplo, duas ou mais pessoas com câncer de mama, ou de próstata, ou do mesmo tipo de leucemia, etc. Casos diferentes descaracterizam carga genética. Acrescentou que somente cerca de 10% dos casos da doença tinham origem na carga genética. A maior parte era desenvolvida ao longo da vida por vários motivos, muitos deles desconhecidos.
Pra finalizar, ele me sugeriu os nomes de mais alguns exames simples que poderiam ser acrescentados aos habituais, porém, mais do que viver em função de investigações exaustivas e estressantes, como eu vinha fazendo há cerca de 8 anos, ele me aconselhou:
Perdoe a tudo e a todos, não guarde mágoa de ninguém, pratique atividade física, reduza o stress e viva feliz.
Com palavras semelhantes a essas o oncologista realizou um pequeno milagre em minha vida que fez toda a diferença.
Muito obrigada, Dr. Mario Liberatti, por ter afastado a nuvem negra que fazia uma grande sombra sobre meus dias!
Ao sair do consultório, senti novamente o calor do sol.
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